Essa é uma pergunta recorrente nos grupos de Cacau Fino dos quais participo e sempre presente nas conversas com amigos e colegas que já estão inseridos nesse mercado crescente e que atende os fabricantes de chocolate Bean to Bar.
E a maior dúvida de todos é: quanto cobro pelo meu cacau?
Aqui no Vale Potumuju demoramos um bom tempo para chegar a uma tabela de preços do nosso cacau, que chamamos de Alto padrão. Depois de muita pesquisa de mercado, comparações com produtores de qualidade similar tanto no Brasil como no exterior, além dos cálculos de custos internos de produção, chegamos a o que achamos justo e competitivo.
Nós produtores de cacau, sempre fomos regidos pelo “preço de mercado”, que há décadas é ditado pelos compradores de cacau commodity e precificados pelos valores flutuantes das bolsas de Londres de Nova Iorque.
A regra de demanda e oferta apresenta as duas forças que garantem o funcionamento de um mercado, determinando preços e a quantidade de produtos oferecidos.
Mas essa regra, quando usada por apenas 4 ou 5 compradores, os grandes “players” mundiais do mercado de cacau, se torna mais um mecanismo de controle de mercado do que de fato um garantidor de preços justos.
Isso solidificou uma situação onde os produtores tem poucas opções para venda e sempre estão “amarrados” a contratos de entrega de sua produção negociados pelas regras e preços ditados pelos compradores em valores atuais e/ou futuros, quase sempre com poucas variações entre eles, o que dificulta a concorrência e a busca por valores melhores para quem tem cacau para vender.
No Brasil, diferente de outros mercados produtores de cacau ao redor do mundo, paga-se um ágio pelo nosso cacau há algum tempo. O “Bahia Superior” era considerado um cacau com mais qualidade e por isso sempre houve esse diferencial pago por aqui. Recentemente estamos vendo o movimento destes grandes compradores criando tabelas diferentes para bonificar marginalmente a entrega de um cacau de melhor qualidade, além dos já antigos parâmetros de diferenciais aplicados, como: se o pagamento se dá a Pessoa Física ou Jurídica, se o cacau será entregue ou retirado, ou ainda se o cacau é orgânico.
Mas agora temos outras opções para entrega de um cacau mais trabalhado e com qualidade. É aí que voltamos ao novo nicho de mercado do Cacau de Alto Padrão. Com a chegada dos fabricantes de Chocolate Bean to Bar, que demandam consistência na entrega, alto valor sensorial, além de todos outros valores agregados ao conceito, como sustentabilidade na produção, respeito nos quesitos sócio-ambientais e valores justos distribuídos por toda cadeia produtiva, vemos que os valores do cacau comercializado neste mercado podem variar e muito!
A relação direta entre Chocolate Maker e Produtor de cacau, um dos pilares importantes do Bean to Bar, criam uma confiança e respeito que tem um valor muitas vezes maior do que qualquer tipo de certificação. A honestidade e transparência nessa relação também são importantes e podem criar laços duradouros, além de se tratar de uma negociação direta e sem intermediações, o que também resulta em uma possibilidade de se alcançar preços justos para o cacau de maior qualidade.
Voltando à pergunta, mas quanto vale esse cacau?
Importante colocar aqui, o que nós sentimos na pele quando iniciamos a nossa jornada pela busca da qualidade. A falta de preparação por parte do produtor, no que diz respeito à gestão e aos controles de custos de sua produção de cacau foi o principal fator que contribuiu para nossa incerteza de como precificar um produto final de qualidade.
Portanto para iniciar qualquer processo de precificação, em primeiro lugar, recomendo levantar todos os custos de produção, devidamente acompanhados por controles de custos de mão de obra, insumos, manutenções de equipamentos, depreciações e os investimentos em renovações de roças, capacitações, treinamentos, além dos custos provenientes dos imponderáveis como variações climáticas e pragas. Enfim, resultados financeiros de uma gestão bem controlada. E depois de alcançar um resultado confiável, inseri-lo em sua planilha de produção, onde o Cacau de Alto Padrão representa apenas uma porcentagem de do total produzido, para assim ter uma idéia de quanto foi o custo por Kg. ou Arroba do cacau beneficiado. Não é fácil! E poucos produtores de pequeno ou médio porte estão capacitados ou tem condições de fazer esse controle. Mas de vital importância.
Em segundo lugar, importante saber o que é considerado Cacau de Alto padrão, como suas amêndoas podem ser avaliadas e parametrizadas para que se encaixem nas expectativas dos potenciais compradores e como elas se comparam a outras disponíveis no mercado.
Mas temos alguns novos caminhos abertos recentemente para ajudar neste mistério de como precificar um bom cacau. Hoje já temos alguns parâmetros, que pelo menos na Bahia, tem ajudado a se formatar um valor justo a ser cobrado por amêndoas de qualidade.
Com a chegada da Dengo Chocolates como compradora de Cacau de Alto padrão, vimos uma grande melhoria no entendimento dos produtores de cacau com as definições da empresa do que é considerada essa qualidade. Foram criadas por eles algumas regras simples de avaliação para um pagamento de “prêmio” baseadas em testes laboratoriais, efetuados no CIC (Centro de inovação do Cacau), que parametriza algumas características do cacau, potenciais defeitos, valores mínimos para PH e porcentagens de amêndoas totalmente fermentadas. Com este resultado paga-se uma porcentagem acima do valor de mercado do cacau, diretamente proporcional à qualidade do que está sendo oferecido a eles. Um grande avanço que estimulou muitos produtores a buscarem uma qualidade superior e mais importante, buscar consistência, o que ao meu ver é o maior desafio para nós produtores.
Além da Dengo, temos novas iniciativas como o portal Leilão do Cacau que, além de disponibilizar lotes de qualidade, também faz a conexão entre o produtor e potenciais compradores.
Em terceiro lugar, importante usar outro parâmetro que é o valor de Cacau de Alto Padrão adotado por diversas origens dos países que fornecem amêndoas de qualidade para EUA e Europa há muito tempo. Equador, Venezuela, Perú, Colombia, Costa Rica, El Salvador, República Dominicana, Madagascar, Tanzânia, Indonésia e India, dentre outros, negociam seus melhores lotes de cacau com valores entre duas e quatro vezes o preço de mercado, sempre calculado em dólar. Portanto um Kg. de cacau pode variar entre US$4,50 e US$9,00, dentro de uma média de mercado. O que, considerando um câmbio médio de R$5,00 para US$1,00, nos dá em Reais valores entre R$22,50 e R$45,00 o Kg.
Mas ainda não respondemos à pergunta: qual é o preço justo para meu cacau?
Minha resposta é: faça muita pesquisa, compare os valores e qualidade dos concorrentes, avalie suas amêndoas de cacau, crie consistência na sua entrega e não tenha medo de cobrar um valor que você ache justo!
Como já dissemos aqui, acreditamos que o Brasil tem potencial para ter um grande mercado interno de consumo de chocolates com alto teor de cacau, estes feitos com amêndoas de qualidade pelas marcas de Bean to Bar, além de poder crescer e muito no mercado externo como uma grande origem de Cacau de Alto Padrão.
Vamos acreditar!
Tuta Aquino
@valepotumuju
@baianichocolates