Na literatura conhecemos grandes casais românticos: Romeu e Julieta (William Shakespeare; “Romeu e Julieta”); Elizabeth e Darcy (Jane Austen; “Orgulho e preconceito”); Capitu e Bentinho (Machado de Assis; “Dom Casmurro”); Scarlett O Hara e Rhett Butler (Margaret Mitchell; “E o vento levou”); Dante e Beatriz (Dante Alighieri; “A divina comédia); Penélope e Ulisses (Homero; “A Odisséia”); Lancelote e Guinevere (Marion Bradley; “As brumas de Avalon”); Tristão e Isolda (Hannah Closs; “Tristão e Isolda”) e muitos, muitos outros.
Há grandes injustiças nesse mundo… De todas as naturezas são as injustiças desse mundo… Na literatura há exemplos diversos de injustiças… E para não me alongar por demais, vou logo explicando porque me ocorreu pensar em injustiça, após ter lido “Luanda Beira Bahia” (1971) de Adonias Filho (1915-1999): Caúla e Iuta, personagens centrais desse romance, certamente deveriam estar entre os grandes casais românticos da literatura universal! Mas não só isso: “Luanda Beira Bahia” deveria estar arrebatando leitores(as) em todos os cantos do mundo, e, muito especialmente, entre nós conterrâneos de Adonias Filho! Mas está? Infelizmente, não. E isso é uma grande injustiça…
Adonias Filho soube transpor, brilhantemente, para além das obviedades, os conflitos de Caúla e Iuta e a tragédia que os envolveria, acrescendo ao enredo as identidades culturais entre Brasil (Ilhéus/Salvador) e África (Luanda/Beira), sem perder de vista seu intenso e empolgante lirismo. Já no prólogo, percebemos isso de imediato: “Idade impossível de saber-se, talvez cem ou duzentos anos, teria visto a praia ainda selvagem, o Pontal com três choupanas e Ilhéus sem o porto… Quem a trouxe, simples muda em pedaços de bambu, e a plantou assim tão perto da praia, jamais se saberá. E ali estava, alta e forte, quando se fez a casa. Uma jindiba, aquela árvore…” A jindiba (com jota, assim como grafou Adonias) será, portanto, desde o início e até o final do romance, uma referência simbólica das raízes e da história das personagens que desencadeiam toda a trama: João Joanes, o Sardento e Caúla, seu filho.
“Luanda Beira Bahia” é envolvente e seu texto narrativo-descritivo está repleto de particularidades que transportam o(a) leitor(a) para as características mestiças de cada personagem. Um atributo que Adonias Filho fez questão de evidenciar descrevendo as similitudes do modo de vida do povo brasileiro e do povo africano. Desta maneira Adonias aproximou culturas e nos brindou com um enredo cheio de cores, melancolias, tragédias, seduções, culturas e histórias.
Depois de muitas idas e vindas, brigas e conciliações, encontros e desencontros, Caúla e Iuta se apaixonam. Passam a viver como marido e mulher. Caúla, no entanto, com saudade de sua terra, Ilhéus, decide voltar, trazendo Iuta. Assim que chegam eles avistam a jindiba, quase como uma sacerdotisa, reafirmando aquilo que se cumpriria, a despeito dos desejos e dos sonhos dos amantes. Também, logo que chegam, Iuta anuncia que está grávida. Mas, quase ao mesmo tempo ainda, o casal se reencontra com alguém que mudaria a história deles, tragicamente… O que nos reservará o mestre Adonias Filho neste último e extraodinário lance? O que se revelará de tão trágico para aqueles jovens apaixonados? O que seria capaz de mudar tão radicalmente aquela felicidade? Leia!, mas, sem pressa! Vá sentindo as tensões e se encante lentamente…
A história de “Luanda Beira Bahia” nos cativa desde o começo até depois do fim, porque ainda ficamos pensando, um tanto perturbados, na natureza daquele amor trágico entre Caúla e Iuta… Que, muito justamente, deveriam estar entre os grandes casais românticos da literatura universal!
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