O brasileiro está comprando mais chocolates. Nos últimos quatro anos, a penetração nos lares brasileiros do doce passou de 85,5% em 2020 para 92,9% em 2024. Isso quer dizer que, a cada dez lares, cerca de nove têm alguma variação na despensa — isso inclui barras de chocolate, bombons, wafer e outros formatos.
Nesse mesmo período, a frequência de consumo também aumentou de 56% para 65%, o que aponta que os consumidores compram chocolates semanalmente. Os dados são do Kantar WorldPanel, coletados pela Mondelez. Cada pessoa consome em média 3,9 kg de chocolates por ano, conforme os dados mais recentes da Abicab (Associação Brasileira da Indústria de Chocolates, Amendoim e Balas). O número é o mais alto dos últimos cinco anos.
Cacau e chocolates mais caros
Aumenta o consumo mesmo com alta dos preços. Esses números de compra e consumo crescem ao mesmo tempo em que o cacau, matéria-prima do chocolate, alcança níveis recordes de preço: ficou 174,7% mais caro em 2024, aponta o índice do Intercontinental Exchange (ICE) e CME Group.
Repasse de preço acima da inflação. O repasse para o consumidor, porém, foi mais brando, de 11,99% no aumento do preço dos chocolates, segundo o IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor), mas ainda assim acima da inflação do ano, que ficou em 4,83%.
Variação no preço do chocolate nos últimos anos:
- 2024: 11,99%
- 2023: 3,05%
- 2022: 13,57%
- 2021: 7,10%
- 2020: 6,53%
O que aconteceu?
O cacau ficou bem mais caro em 2024. Mais que dobrou de preço ao longo do ano passado, muito devido às doenças e condições climáticas que devastaram plantações na África Central, que concentra 80% da produção mundial.
Hoje, a safra brasileira da fruta não é suficiente para abastecer o mercado interno. O Brasil já foi o maior produtor de cacau do mundo, mas as lavouras foram quase dizimadas nos anos 1990 pela praga “vassoura de bruxa”. Em 2024, foram importados US$ 125 milhões em cacau da Costa do Marfim e de Gana, mostra o Comex Stat, do governo federal.
Esses fatores pintam um cenário onde a demanda só cresce, mas a oferta não segue o mesmo ritmo. Há déficit na safra mundial há alguns anos. Por isso, analistas preveem que a alta deve seguir o mesmo ritmo em 2025 — com um repasse mais significativo no preço dos chocolates a partir deste ano.
Empresas não repassaram todo o custo ao consumidor. Ao que tudo indica, até agora, as companhias conseguiram absorver o aumento dos preços do cacau antes de chegar ao consumidor final devido a contratos futuros assinados nos anos anteriores. “A indústria geralmente trabalha com hedge, em contratos futuros que normalmente duram dois anos. Então, eles negociam um preço fixo para o cacau por um período determinado de contrato, de forma que a flutuação do preço do cacau não é atualizada diariamente para a indústria”, explica Adriana Murasaki, consultora adjunta de pesquisa na Euromonitor International.
Repasses devem começar neste ano. A previsão é que esses contratos vençam entre 2025 e 2026, quando os repasses mais agressivos devem começar a ser vistos.
Empresas adotam estratégias ante altas
Empresas querem comprar cacau brasileiro. Para escapar das variações de preço de outros países e também do câmbio, que varia de acordo com o valor do dólar, as gigantes do ramo investem para usar cada vez mais o cacau brasileiro na composição dos chocolates. A Mondelez, líder do segmento com 22% de marketshare, diz que pretende usar 100% da safra nacional em seus doces até 2026. A companhia não informa a porcentagem utilizada atualmente.
Já a Cacau Show, segunda maior empresa do ramo no país, diz que a compra depende da safra. “Tivemos períodos que utilizamos 80% do cacau brasileiro em nossa produção. Para este ano, estamos chegando na margem dos 40%”, informou por nota.
Quando esse cenário do cacau aconteceu (alta do preço), estávamos já há três anos fomentando iniciativas que fomentam a produção nacional do cacau, o Cocoa Life, que levamos tecnologia para esses produtores. Do outro lado, houve a transformação do portfólio [para suprir o aumento dos preços].Juliana Bonamin, vice-presidente de Vendas da Mondelez Brasil
Mudança na fórmula e redução de tamanho. As estratégias mais comuns da indústria incluem o lançamento de tamanhos e pacotes menores dos chocolates já conhecidos e até mesmo alteração na composição dos produtos, para terem menos chocolate. “São lançados produtos classificados como chocolate, mas com menos teor de cacau em si. São lançamentos com bolachas, recheios cremosos de outro tipo, amendoim, etc. Todas essas adições fazem diminuir a porcentagem de cacau dentro e ajudam a manter a margem de lucro”, aponta Adriana, da Euromonitor.
Consumo continua, apesar dos preços. Mesmo se o aumento nos preços vier, o consumo não deve diminuir, defende Adriana. “O brasileiro tem paladar muito doce e as oportunidades de consumo são muito amplas, temos produtos para todas as ocasiões. Desde o bombonzinho após almoço até a caixa para presente — o que entra na questão que chocolate também virou um presente quase premium por aqui. Isso tudo movimenta a categoria, independentemente das altas.”
Oportunidade para os mercados
Faturamento alto. A pesquisa NIQ Monitor, feita pela Nielsen com a Mondelez, apontou que a categoria de chocolates faturou R$ 22 bilhões no ano passado, cerca de 6% do faturamento dos supermercados, ocupando apenas 2,1% de espaço nas lojas.
Chocolates ficam a mão. Conforme a pesquisa, 59% dos chocolates ficam expostos em exibição regular, ou seja, nos corredores de alimentos; 25% no checkout, próximos aos caixas; 5% na ponta de gôndola e 10% em outros locais.
Mais exposição, mais vendas. O estudo estima que, caso houvesse uma equiparação para que a categoria ocupasse mais espaço, seria possível aumentar o faturamento da categoria em até R$ 200 milhões neste ano.
“Ao longo de 2023, a gente fez testes e deu esse resultado. Fizemos mais de 30 clientes nossos aumentarem os espaços para além das gôndolas próximas aos caixas. Essas lojas tiveram crescimento no faturamento de 20%. Como o espaço atual é pequeno, todos os concorrentes disputam aquele pedaço de espaço”, explicou Bonamin.
Fonte: bol.uol