Chocolate é celebrado em festival na Bahia

Ilhéus (BA) – Na varanda da fazenda, há vassouras de palha penduradas, vasos de flores em vários tons, peças de artesanato da região e uma tranquilidade que convida ao aconchego e às delícias do paladar. Com um sorriso e o jeito baiano inconfundível, a dona da casa, Dadá Galdino (foto), de 55 anos, vai logo dizendo bem-humorada que as vassouras não têm nada a ver com bruxaria, muito menos com aquela velha história de que espantam visitas. “Todos são bem-vindos aqui, mas já nasci com meu caldeirão”, brinca a mulher de sangue brasileiro bem misturado: descendente de índios pataxós e tupinambás e de italianos e africanos. “Sou um pouco xamânica”, define-se.
Depois dos abraços e cumprimentos na porta, Dadá – proprietária com o marido, Gerson Marques, da Fazenda Yrerê, no quilômetro 11 da rodovia Ilhéus-Itabuna, no Sul da Bahia – convida para entrar e vai direto para a cozinha, um lugar de alquimia e sentidos aguçados. Antes, mostra a máquina de costura, colada na sala de visitas, na qual se debruça para fazer arte e dar vazão à criatividade tecida com esmero. Mas é na cozinha, forrada com azulejos azuis, que Dadá passa muitas horas transformando em sabor, aroma e textura um dos frutos mais preciosos da terra imortalizada pelo escritor Jorge Amado (1912-2001): o cacau.
Na hora de bater um bolo, fazer uma farofa ou temperar as comidas, Dadá assegura que é tudo no olho. “O ‘tanto’ que ponho na panela não é pesado na balança, mas sentido pelas mãos. Sempre foi assim. Sigo o conselho de minha mãe, que já dizia: ‘Colocar sal e açúcar na dose certa é um dom’”, revela a baiana com um sorriso e já esperta nas redes sociais, especialmente o Whatsapp. Ao seguir a receita do bolo de chocolate nesta página, não se preocupe, caro leitor, em cometer erros, pois, especialmente para o Degusta, ela fez tudo como manda o figurino.

Momentos
Se uma delícia é provar uma fatia do bolo feito com o chamado chocolate de origem, que significa produzido em Ilhéus, outra é bater papo com Dadá, na cozinha ou na varanda. O encontro saboroso ocorreu durante o recente Festival Internacional do Chocolate e Cacau, ocorrido no município e iniciativa do Costa do Cacau Convention Bureau e Associação de Turismo de Ilhéus, com apoio do governo da Bahia e parceiros. Dando atenção à turma de jornalistas que foi conhecer a Yrerê, Dadá, que quando adolescente morou em Belo Horizonte e se lembra da Avenida João Pinheiro, contou alguns segredos da alquimia particular. Gosta muito de preparar – e as amigas de longa data e os dois filhos agradecem, pratos que a transportam para a infância, entre eles banana frita, bolo de milho e farofa de carne seca.
A manhã vai passando lenta, com um friozinho de inverno que pegou até a Bahia de jeito, embora iluminada pelo sol e acalentada pelas águas mornas do Atlântico. Dadá conta histórias, confessa o prazer que tem em fazer seus quitutes e misturar ingredientes, a alegria de sentir as misturas nos dedos e a bênção de temperar a comida com o que vem lá do fundo do coração: o amor. Para coroar o dia, basta ler o verso do compositor Caetano Veloso colado na janela forrada com renda branda, e ganhar força: “Todo dia o Sol levanta e a gente canta o Sol de todo dia…”

Alimento dos deuses
Quem visitar Ilhéus, antiga São Jorge dos Ilhéus, e gostar de chocolate, vai aprender, na prática, o verdadeiro sentido dessa delícia que é chamada muito apropriadamente de “alimento dos deuses”. Não o chamem de doce, por favor, pois pode ser considerada uma heresia. E tenha cuidado ao citar determinadas marcas, pois, para os puristas, é tudo parafina ou refugo. Mas, calma, pois, como diz um chocólatra da terra, o melhor mesmo é aquilo que você gosta.
Os técnicos no assunto explicam que, assim como no vinho, azeite e café, o lugar de origem do cacau tem características que se revelam no produto final. O chocolate de origem precisa ser feito com frutos da mesma região, cultivados sob rígidas normas de manejo e beneficiamento. Assim, a maior parte do produzido na Bahia é feita com alto teor de cacau, a partir de amêndoas selecionadas e livre de conservantes, sabores sintéticos e aromatizantes.
Para entender melhor o passo a passo de todo o processo de produção, os técnicos mostram o caminho: colheita, seleção, higienização, fermentação, secagem e análises físico-químicas, microbiológicas e de degustação. Esse é o ciclo cuidadosamente realizado durante cerca de 20 dias para a obtenção de amêndoas de cacau fino nas fazendas do Sul da Bahia. A matéria-prima tem elevado o status da Bahia – e do Brasil – no paladar do mundo quando o assunto é chocolate de qualidade. Prova disso é a crescente demanda pelo mercado especializado, como a alta confeitaria. “Há algum tempo produtores da Bahia estão fazendo um trabalho de qualidade na manutenção da fazenda, na secagem e no tostado, e conseguindo um cacau de boa qualidade”, diz a especialista Chloé Doutre-Roussel, em nota divulgada pelos organizadores do recente Festival Internacional do Chocolate e Cacau.
O mercado das amêndoas selecionadas é um universo novo para os produtores da região. Fortemente abalada pela praga da vassoura-de-bruxa nos anos 1990, a cacauicultura no Sul da Bahia vem se reinventando. O processo começou há alguns anos, depois da visita de produtores locais ao Salon Du Chocolat de Paris e do contato com o método de produção de chocolate chamado bean to bar (da amêndoa à barra, em livre tradução). “Na década de 1990, auge da crise do cacau, não tínhamos chocolate. Nunca tivemos nada que fizesse alguma diferença economicamente ou na imagem da região. Hoje, temos um movimento forte em prol da verticalização da produção do cacau ao chocolate e da melhoria do cacau produzido”, destaca o idealizador do evento, Marco Lessa sobre o grande volume de negócios em torno do chocolate de origem gerado nos últimos anos no estado. Atualmente, são mais de 40 marcas baianas de chocolate de origem.

(*) O repórter viajou a convite do Festival Internacional do Chocolate e Cacau.

Bolo de chocolate da Dadá

Ingredientes
1 xícara de leite; 2 xícaras de farinha de trigo; 4 colheres de sopa de manteiga; 1 colher de sopa de fermento; 2 colheres (100 gramas) de pó de cacau. Cobertura: 250g de chocolate (56% de cacau); 300g de leite condensado; 300g de creme de leite; 60g de gotas de chocolates. Se preferir, pode usar nibs (amêndoa de cacau seca e triturada).

Modo de fazer
O bolo: juntar os ingredientes e fazer o bolo de modo tradicional. A cobertura: Colocar todos os ingredientes numa panela e levar ao fogo para cozinhar (em fogo baixo ou banho-maria). Mexer até ficar em ponto de bala. Tirar do fogo e bater bem até ficar com brilho. Finalmente, cobrir o bolo e enfeitar com as gotas ou nibs.
Fonte: Uai

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