Chocolate: uma revolução simbólica e econômica

Belém. Depois de fazer o mundo conhecer o tucupi e o jambu ou, ainda, as frutas tropicais como o açaí e o cupuaçu, o Pará está perto de ter seu nome associado aos sabores mais finos do chocolate. Afinal, ao contrário do que se pensava, o cacaueiro não é originário da América Central. Ele é nativo da Amazônia, região que oferece uma variedade de plantas cacaueiras, muitas ainda desconhecidas.

Bahia. Mas, se o cacau é originário da Amazônia, o que explica o fato de os baianos ocuparem tamanha proporção na produção da planta? Segundo Lessa, uma das questões é a própria geografia. “Os biomas do Pará ficam muito distantes um dos outros e, também por isso, são muito distintos, o que traz algumas dificuldades de acesso e transporte. Mas isso não é um grande complicador porque algumas adaptações já estão sendo feitas, como, por exemplo, a criação de formas mais específicas de armazenamento das amêndoas. O que torna o caso da Bahia mais específico é que as regiões de produção ficam mais concentradas, e isso facilita a disseminação da cultura do cacau”, afirma.
As áreas de produção cacaueira do Pará se distanciam de Belém e se desenvolvem ao longo da rodovia Transamazônica, em cidades como Altamira – o maior município produtor de cacau do país. Mas, para que essa produção se torne maior em termos quantitativos e qualitativos, alguns esforços são necessários como, por exemplo, a construção de indústrias de moagem. “Hoje, o cacau paraense é comprado e levado para a Bahia para ser moído e transformado em pó ou em manteiga. Mas essa situação já aponta para novas possibilidades, como a atração de investimentos para a construção de um parque de moageiras”, diz Lessa. Ele lembra que é preciso também desenvolver a instalação de pequenas unidades para a produção de chocolates.

Números que falam

Segundo dados da Associação Brasileira da Indústria de Chocolates, Cacau e Amendoim, Balas e Derivados (Abicab), o consumo do chocolate premium, de maior concentração de cacau, representa apenas 8% do que é produzido no país, número que cresceu 20% nos últimos cinco anos.
 Marcos Lessa, idealizador do Festival Internacional do Chocolate e Cacau Amazônia, explica que todo esse incentivo ao cacau se deve principalmente à desconstrução do mito de que o brasileiro não gosta e não produz chocolates finos. “Chegamos à conclusão de que a produção de chocolates no Brasil foi mal assimilada por um tempo. A grande indústria sempre explorou a imagem do chocolate ao leite, com percentual reduzido de cacau. Hoje, podemos fazer chocolate com padrão internacional, com o diferencial de um produto mais concentrado, feito basicamente de massa e manteiga de cacau”, afirma.
E os números chamam a atenção. O Brasil tem cerca de 40 marcas que trabalham com esse chocolate de origem, enquanto a França tem apenas seis.
 
Cacau não é necessariamente doce
Em tempos de revalorização da produção cacaueira no Brasil, os usos do cacau e do chocolate têm sido reinventados e chegado, inclusive, aos pratos salgados. Na verdade, essa junção não é nenhuma invenção da roda. Os mexicanos já faziam essa harmonização no tradicional mole poblano, prato de origem asteca que, basicamente, é uma receita salgada de molho para carnes que leva vários tipos de pimentas e chocolate.
Apesar de a combinação não ser inédita, é verdade que misturar chocolate na comida salgada não faz parte dos cardápios mais rotineiros, embora tenha ganhado adeptos como a chef chocolatier Mírian Rocha, que assina a linha de chocolates em harmonizações com vinhos, cervejas, chás, cafés e salgados.
“Uma coisa importante é que a gente precisa reaprender que o cacau não é doce. Nós é que acrescentamos o açúcar para fazer o chocolate, que também pode ser mais um ingrediente de comidas salgadas. O que nós precisamos é de cultura gastronômica, desgustando e disseminando informação. Afinal, por que chocolate e outros temperos não haveriam de combinar?”, indaga e adverte. “Isso, claro, se estivermos falando do chocolate de origem, em especial as versões mais concentradas, com maior porcentagem de cacau na sua composição. Porque os chocolates mais industriais são muito doces, e isso não facilita muito as harmonizações”, afirma.
O chocolatier De Mendes concorda. “Em termos de valores sensoriais, de sabor e aroma, o uso de chocolate em pratos salgados não foge muito às referências que já temos. A informação é que assusta porque traz certo exotismo”. De Mendes, por exemplo, quando cozinha informalmente para a família e os amigos nos fins de semana, gosta de usar o nibs, amêndoa de cacau torrada e triturada, em risotos de pato ou de camarão. “Eu faço por hobby, mas esse certamente é um prato que agradaria aos clientes mais exigentes da alta gastronomia”.
E ele não está sozinho na aposta. Andrei Martinez, chocolatier de Canelas, no Rio Grande do Sul, esteve no Pará para apresentar um pouco do seu trabalho e conhecer a produção do Estado. Ele está animado com o novo ramo que irá empreender com a abertura do Bistrô Origem de Cacau. “Essas harmonizações com a cozinha salgada estimulam o consumo do chocolate fino. Esse é o nosso grande desafio: ensinar às pessoas novos usos do chocolate de maior qualidade. Isso aconteceu com o café e com o vinho, por exemplo, e o cacau vem seguindo o mesmo caminho”. Mas, como toda mudança de hábito demanda tempo e experimentos, Martinez prefere evitar os riscos. “Vamos oferecer algumas harmonizações com o salgado, tentando fazer com que o consumo das refeições seja uma experiência. Mas, como ainda não temos esse costume, por precaução, iremos oferecer opções em que o chocolate venha à parte”, brinca. Fonte: O Tempo

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