Por Caio Santos – Operador de commodities agricolas da Stone X
Vindo de um ano atípico, o ciclo atual tem sido uma experiência de reajuste das expectativas do mercado em relação ao “novo normal” do mundo pós-covid. Nesse momento estamos encerrando o quinto mês da safra 20-21 e caminhando para o final da safra principal nos maiores players produtores da commodity.
Em fevereiro os preços futuros do cacau em NY (2º contrato) interromperam a sequência de queda dos dois meses anteriores, se valorizando +5,25%. O mês foi de maior volatilidade, com 237 pontos de variação entre a máxima e a mínima, 16% acima do range esperado de acordo com o prêmio de risco embutido nas opções no dinheiro negociadas no mercado. O aumento no volume de negócios também merece destaque, com média diária 45.615 contratos negociados ao longo das expirações, contra média de 35.698 em janeiro.
Toda essa movimentação veio na segunda quinzena do mês, conforme novas notícias contribuíram para tirar os preços da consolidação que dominava os negócios desde meados de dezembro. Na semana passada, o anúncio preliminar da ICCO, estimando superávit de 100 mil toneladas para o ciclo 20-21, pressionou as cotações e marcou a mínima do mês em 2371. Contudo, na última semana os touros reapareceram no mercado, conduzindo à recuperação de 9,82% desde a mínima até o fechamento em 2604 (máxima de 2614).
A valorização de preços na última semana foi guiada pelo o crescente otimismo sobre a recuperação na demanda por chocolate, que poderia ganhar velocidade com o aumento da distribuição de vacinas ao redor do mundo. É fato que o alívio das medidas de restrição pode estimular a demanda, mas não se espera que essa recuperação venha tão cedo, pelo menos não até o segundo semestre de 2021 – isso é evidenciado tanto pelos dados fracos de venda de chocolates no varejo ao redor do mundo, quanto pela combinação dos ratios, que já acumula recuo de 10,5% na Europa e 6,13% nos EUA desde julho 2020, sem recuperação observada nas últimas semanas.
Ainda, mesmo com um reaquecimento no consumo de chocolates, é factível termos um superávit considerável na temporada, conforme a própria estimativa preliminar da ICCO apontou no mês. Atualmente a StoneX projeta demanda (esmagamento) de 4,729 milhões de toneladas na safra 20-21, um aumento de 2,13% em relação à safra passada. Com o que se projeta de produção total este ano (4,920 milhões), o mundo finalizaria o ciclo com 142 mil toneladas de superávit. Mesmo considerando níveis de consumo pré-covid, mantendo a produção, ainda teríamos 86 mil toneladas de superávit.
O cenário de oferta para este ciclo também parece factível, na medida em que a produção combinada entre costa do Marfim e Gana até 24/jan estavam cerca de 3% acima do que o somatório produzido pelos dois países no mesmo período do ciclo 19-20, e quase 15% a frente no Equador (também no comparativo entre out-jan entre esse e o ano anterior). Levando em consideração a elevação das chuvas observada em fevereiro, é bem provável que a boa produtividade se estenda também para a safra intermediária.
Colocando esses fatores em perspectiva, o palco que se constrói não nos deixa escapar da possibilidade de que iminente sobreoferta ainda possa exercer pressão baixista sobre as cotações da bolsa, especialmente após as investidas altistas recentes. Aos produtores, o momento se apresenta como oportunidade para avaliar estratégias para 2021 e proteger os valores praticados hoje nas telas futuras de cacau. O mercado vai acompanhar agora a confirmação da flexibilização dos lockdowns ao redor do mundo e as primeiras estimativas oficiais da ICCO para o ciclo 20-21. Março tem tudo para ser novamente um mês de grandes oportunidades.