A entressafra de algumas frutas regionais e a restrição ao cacau devido à praga da Monilíase no Amazonas e outro vírus que afeta o fruto no exterior influenciaram no aumento do preço de sorvetes, picolés e produtos similares em Manaus neste mês de julho. O reajuste foi entre 10% e 16,6% e afeta especificamente os sorvetes com embalagens fechadas e àqueles conhecidos como gelatos, vendidos por quilo no self-service.
Alguns sabores estão fora da oferta de sorveterias como o tucumã, em função da escassez da fruta no Amazonas. O frete para trazer frutos de outros estados também encaressem o custo final ao consumidor.
“O açaí teve um aumento de aproximadamente 30% na saca de 50 quilos. O tucumã, que custava R$ 20 o quilo, agora custa R$ 100 ou até mais. Também temos a questão do frete, as distâncias”, diz José Silva, gerente da Sorveteria Glacial, a maior rede do gênero no estado.
Outros insumos como o leite e o chocolate também influenciam no custo. “O aumento do chocolate foi algo absurdo porque usamos chocolate tipo exportação e o aumento foi de mais de 100%”, diz José Silva. Ele esclarece que quase a metade da produção da sorveteria depende de insumos que vem de fora de Manaus e estão sujeitos à influência do câmbio, no caso o dólar.
Na prática, se um picolé de fruta custava R$ 2,50 na fábrica, passou para R$ 2,83, um aumento de 12% na unidade. Um picolé com cobertura que custava R$ 3 na fábrica, agora custa R$ 3,40, aumento de 13,4%.
Do fabricante ao consumidor, o valor é multiplicado por dois, em média. Um picolé com cobertura pode alcançar os R$ 6 e um copinho de 100ml pode ser vendido por R$ 7.
A Glacial informou que trabalha para que o preço de seus produtos seja coerente com a realidade local. “Apesar de os aumentos na matéria-prima do sorvete, a gente procura manter um valor acessível aos clientes e aos revendedores”, diz José Silva.
A fábrica de sorvetes e picolés MegBom afirma que houve um aumento de 35% nas frutas regionais usadas na fabricação de seus sorvetes, mas conseguiu fazer um bom estoque de matéria-prima e decidiu não repassar o aumento aos consumidores.
“O açaí, cupuaçu e o maracujá são os itens que mais uso na produção, todos tiveram um aumento médio de 35%. Outro ponto a se destacar são os impostos que tiveram um aumento considerável também. Em contra partida na safra do leite, que é o período de janeiro a abril, tivemos um preço melhor que o do ano passado e então não iremos reajustar nenhum valor”, diz o sócio proprietário José Ribamar Júnior.
Na fábrica, o picolé Sorvelito custa R$ 1,30 e o preço sugerido para o consumidor final é de R$ 2. O copinho de 100ml sai por R$ 1,40 e o preço ao consumidor é de R$ 2 também.
Crise do cacau
Segundo o vice-presidente da Abrasorvete (Associação Brasileira do Sorvete e Outros Gelados Comestíveis), Roque Dalcin, 30% dos produtos oferecidos nas sorveterias são derivados de cacau.
“O setor de sorvetes enfrenta atualmente um cenário desafiador devido à crise global do cacau, que tem impactado significativamente os custos de produção. Sabemos que a crise do cacau não é apenas uma questão de economia de mercado. Ela tem profundas raízes nos desafios climáticos que afetam os países produtores de cacau. O aumento nos preços dos derivados do cacau, como o chocolate em pó e a manteiga de cacau, tem sido especialmente significativo para o segmento sorveteiro”, diz Dalcin.
Segundo dados técnicos da consultoria americana TRS (Tropical Research Service), que visita regularmente fazendas de cacau na África, no Equador e Brasil em busca de dados primários, “grande parte das fazendas de cacau são lavouras arcaicas”.
“O cacau é uma cultura que ainda está no século 19. É uma agricultura camponesa, que não é sofisticada. Na África Ocidental, os padrões de manejo são muito baixos,” diz o chefe de pesquisa da TRS, Steve Wateridge.
A quebra na safra de cacau na África é resultado da infestação dos cacaueiros pelo cacao swollen shoot virus, uma praga que causa um inchamento anormal das brotações, reduz a produtividade da lavoura e pode levar à morte da planta.
A praga não existe no Brasil, mas já dizimou colheitas em outros lugares. Nos anos 60 e 70, quebrou pela metade a produção de Gana, quando o país era o maior produtor mundial de cacau.