Por ELIANE SILVA
Julia Torres Arléo tem dez anos. Da quarta geração de uma família de produtores de cacau da Bahia, sonhava produzir seu próprio chocolate, da amêndoa à barra, o conhecido bean-to-bar. No aniversário de oito anos, pediu aos pais – Juliana Alves Torres e Lucas Arléo – uma melanger, moedor de pedra para triturar as amêndoas de cacau e transformar em chocolate.
Começou fazendo ovos de Páscoa. Junto com a mãe, vendeu toda a produção. Foi o início da marca Ju Arléo, que se define como o primeiro chocolate “tree-to-girl (da árvore para a menina) do Brasil”. E, neste mês, com seu chocolate especial, Julia foi uma das estrelas do Chocolat Festival, realizado em Ilhéus (BA) para fomentar a cadeia produtiva do chocolate desde o fruto até o produto final.
O evento reuniu diversas marcas de origem, bean-to-bar, premium e gourmet. Segundo a organização, entre os dias 21 e 24 de julho, foram 120 expositores. Os cerca de 40 mil visitantes geraram R$ 5 milhões em negócios. Os números superam a última edição, em 2019, antes da pandemia, que recebeu 25 mil visitantes e faturou R$ 4,5 milhões.
Marco Lessa, organizador do Chocolat Festival de Ilheus desde 2009, diz que os produtores de cacau baianos já fabricam 150 marcas de chocolate e derivados como nibs, mel de cacau, geleia, chá, cachaça e até cerveja.
“As marcas estão mais profissionais. E estão surgindo produtores nacionais de equipamentos para a fabricação de chocolate, como melanger, torradeira e temperadeira, o que torna o processo de fabricação mais barato”, ressalta.
Entre os participantes, estavam reunidos em um estande coletivo expositores certificados a indicação geográfica Sul da Bahia, que representa quase 3,5 mil produtores da região. O projeto foi criado para estabelecer uma relação mais justa entre os cacauicultores e o consumidor.
Segundo o diretor-executivo da IG Sul da Bahia, Cristiano Sant’Anna, o cacauicultor pode ganhar até R$ 2.000 a mais em cada saca de 60 kg agroindustrializada. “O produtor vende o cacau e pode usar parte dessa renda para pagar a fabricação e embalagem do chocolate com sua marca impressa, a preço de custo. Então, ele pode revender no mercado que desejar. Já o consumidor final compra as barras por 25% a menos do que a média de outros chocolates de origem do mercado”, diz ele.
Produção premiada
A família de Julia Arléo, da Fazenda Santa Rita, produz, além dos dela, outros seis tipos de chocolate. Os menos intensos têm a proporção de 36% de cacau. Todos são certificados pela IG Sul da Bahia, na categoria de Indicação de Procedência. Uma produção premiada em concursos no Brasil e no Exterior.
Com a marca Ju Arléo, a barra de chocolate intenso 70% com mel de Uruçu conquistou medalha de prata em um concurso de chocolate em Londres. No ano passado, outra barra, de chocolate intenso 70% cacau, ficou em 3º lugar no Prêmio CNA Brasil Artesanal.
Até 2016, a Fazenda Santa Rita produzia apenas o cacau tradicional, comercializado como commodity. Foi quando o pai de Julia resolveu dar outra direção para o negócio e passou a produzir também amêndoas de alta qualidade, o chamado cacau fino. A fábrica foi instalada em Uruçu, município vizinho a Ilhéus, com uma produção de cerca de 50 kg de chocolate por mês.
Julia, que costumava acompanhar o avô pelas lavouras de cacau, tem a missão de continuar com o legado da família na produção de chocolates de alta qualidade. Mas quer ir além disso. “Quero ter uma loja de chocolate e ser jogadora de futebol”, diz ela, que sonha em ser centroavante.
Fonte: Globo Rural