Por: Claudemir Zafalon
O cacau segue sendo uma das commodities mais sensíveis ao atual ambiente geopolítico e econômico global. Em um cenário marcado por incertezas, desde decretos migratórios nos EUA até indicadores econômicos da Europa e da África, o produto enfrenta volatilidade acentuada, com impactos diretos nos preços, na formação de estoques e na dinâmica de oferta e demanda.
Volatilidade e Comportamento dos Fundos
O contrato de julho do cacau em Nova York fechou ontem a US$ 9.948 por tonelada, após atingir a máxima de US$ 9.990 e mínima de US$ 9.552, em uma sessão de forte oscilação. Com 7.883 contratos negociados no vencimento mais próximo e volume total de 24.384 contratos, o mercado deu sinais de retomada de fôlego, ainda que sob um cenário de instabilidade. O interesse em aberto permaneceu em 100.883 contratos, refletindo cautela entre operadores.
A performance foi influenciada por fatores técnicos e pela postura dos fundos especulativos, que têm ajustado posições diante de sinais conflitantes na economia global. O crescimento dos estoques certificados nos portos norte-americanos, agora em 2.227.780 sacas, reforça uma pressão de curto prazo nos preços, indicando menor retirada física e certa paralisia nas cadeias industriais.
Cenário Internacional e Efeitos no Cacau
A assinatura de uma proclamação presidencial por Donald Trump, barrando a entrada de cidadãos de 12 países nos EUA sob alegações de segurança, elevou o nível de tensão nos mercados globais. Embora não tenha efeito direto sobre o comércio do cacau, a medida reforça um ambiente de risco político crescente, com potencial para prejudicar acordos multilaterais, comprometer rotas logísticas e desencorajar investimentos em cadeias agrícolas e de exportação, especialmente nas regiões em desenvolvimento.
No Senado dos EUA, a resistência dos republicanos conservadores ao pacote de cortes de impostos e gastos proposto por Trump adiciona um novo elemento de incerteza fiscal. A indefinição sobre o rumo da política econômica americana pressiona o dólar e, consequentemente, interfere nos preços internacionais de commodities. Ontem, o dólar apresentou leve recuperação frente ao euro após cair com dados negativos de produtividade e projeções mais fracas para o crescimento dos EUA. A divulgação, hoje, de números como os pedidos de auxílio-desemprego (projeção: 236 mil) e o déficit comercial (esperado: -US$ 63,3 bilhões) pode provocar novos movimentos nos mercados futuros de cacau.
Efeitos Cambiais Diretos no Cacau
A taxa de câmbio do contrato de Real x Dólar com vencimento em 30 de junho está cotada a R$ 5,67, afetando diretamente as operações do mercado brasileiro de cacau. Para exportadores, esse nível de câmbio mantém a competitividade externa, incentivando o escoamento da produção. Já para os processadores internos, os custos de aquisição de amêndoas no mercado internacional se elevam, pressionando margens e afetando decisões de compra.
Essa dinâmica é observada também na Europa, onde o euro se manteve firme antes de um possível corte de juros pelo Banco Central Europeu. A valorização da moeda europeia reduz custos de importação para compradores do continente, o que pode estimular a demanda por contratos futuros de cacau, especialmente com foco na cobertura de necessidades industriais para o segundo semestre.
Gana e os Fundamentos de Oferta
Em Gana, um dos maiores produtores de cacau do mundo, a inflação ao consumidor caiu para 18,4% em maio, o menor nível desde fevereiro de 2022. A recuperação econômica do país, que sofreu impactos severos com a crise nos setores de cacau e ouro, ainda é lenta. O ministro das Finanças projeta que, com cortes drásticos de gastos públicos, a inflação poderá ser reduzida para 11,9% até o final de 2025. Essa estabilização fiscal é fundamental para permitir investimentos no setor agrícola e para restaurar a capacidade produtiva dos pequenos produtores, que ainda enfrentam escassez de fertilizantes, crédito e apoio técnico.
O desempenho do cacau no país continuará sendo monitorado atentamente, uma vez que a performance da safra ganesa impacta diretamente os preços globais. Qualquer sinal de quebra, atraso na colheita ou interrupção logística poderá reverter a atual tendência de acúmulo de estoques e impulsionar uma nova onda de alta nos contratos futuros.
Fonte: mercadodocacau