Produtor baiano lidera projeto bilionário que pode revolucionar o cultivo de cacau

No coração do cerrado baiano, um projeto ambicioso está prestes a redefinir os rumos da produção mundial de cacau. O produtor rural Moisés Schmidt está construindo, em Riachão das Neves, a maior fazenda de cacau do planeta — uma iniciativa de US$ 300 milhões que visa transformar a forma como o principal ingrediente do chocolate é cultivado.

O plano envolve o cultivo de cacaueiros de alta produtividade, totalmente irrigados e fertilizados, em uma área superior ao tamanho da ilha de Manhattan — e em uma região até então pouco associada à cultura do cacau. Se bem-sucedida, a iniciativa poderá reposicionar o Brasil como potência global no setor, desafiando o domínio histórico da África Ocidental, onde o cacau é nativo, mas enfrenta atualmente uma crise severa.

“Eu acredito que o Brasil se tornará o celeiro mundial do cacau”, afirmou Schmidt à Reuters, enquanto caminhava por fileiras de cacaueiros jovens, que se perdem na paisagem plana do cerrado.

Aposta ousada em larga escala

O Brasil produz hoje cerca de 200 mil toneladas de cacau por ano — uma fração da produção da Costa do Marfim (cerca de 2 milhões de toneladas) e de Gana (700 mil toneladas). Schmidt estima que o país tenha potencial para alcançar até 1,6 milhão de toneladas em dez anos, caso se confirme o plantio de até 500 mil hectares com técnicas modernas e em escala industrial.

Na primeira fase, já estão em cultivo cerca de 400 hectares com árvores de alto rendimento, que produzem 3.000 kg por hectare — dez vezes mais que a média brasileira e seis vezes mais que a da Costa do Marfim. A meta, porém, é ir além: chegar a 4.000 kg por hectare.

O segredo está na densidade do plantio: 1.600 árvores por hectare, contra 300 nas lavouras tradicionais. A única etapa ainda não mecanizada é a colheita.

“O método é revolucionário”, diz Tales Rocha, agrônomo da TRF Consultoria Agrícola. “Em cinco anos, tudo o que sabíamos sobre produção de cacau pode estar ultrapassado.”

Tecnologia e parcerias

Para viabilizar o projeto, Schmidt criou a BioBrasil, viveiro com capacidade para produzir até 10 milhões de mudas por ano, utilizando tecnologia da dinamarquesa Ellepot. As mudas são resultado de anos de seleção positiva — propagadas a partir das árvores com melhor desempenho em campos de teste.

A empresa já atraiu o interesse de gigantes do setor. A americana Cargill participa da fase inicial da fazenda e negocia a ampliação da parceria. Segundo Schmidt, praticamente todas as grandes fabricantes de chocolate e comerciantes globais de cacau estão em tratativas com ele ou outros produtores brasileiros para garantir fornecimento a longo prazo.

“Estamos estruturando os contratos agora”, afirmou, sem citar nomes devido a cláusulas de confidencialidade.

Outra gigante do setor, a suíça Barry Callebaut, confirmou acordo para instalar uma fazenda de cacau de 5.000 hectares na Bahia, como parte de sua Iniciativa Agricultura do Futuro, que busca diversificar a geografia do cultivo com tecnologias mais sustentáveis e produtivas.

A Mars, dona das marcas Snickers e M&M’s, também se movimenta. A empresa montou um campo de testes próximo à fazenda de Schmidt, de olho nas vantagens da região: relevo plano, solos férteis, boa disponibilidade de água e infraestrutura agrícola consolidada.

Oportunidade nas dificuldades alheias

A movimentação brasileira ocorre num momento em que a produção de cacau vive uma crise global. A Costa do Marfim e Gana, que juntos concentram mais de 60% da produção mundial, enfrentam queda drástica nos volumes colhidos há três anos consecutivos, devido a doenças, mudanças climáticas e envelhecimento das lavouras.

O resultado foi uma disparada nos preços: o cacau chegou a bater o recorde de US$ 12.931 por tonelada em dezembro de 2024, embora tenha recuado para cerca de US$ 8.200 atualmente — ainda bem acima da média histórica.

“Não imaginávamos que a escassez chegaria tão cedo”, diz Schmidt, que iniciou os estudos de viabilidade do projeto em 2019. Ele garante que sua operação é lucrativa mesmo com o cacau a US$ 4.000 por tonelada — e altamente rentável a partir de US$ 6.000.

Desafios e incertezas

Apesar do entusiasmo, especialistas alertam para riscos. A fitopatologista Karina Peres Gramacho, da CEPLAC, vê vulnerabilidade no uso massivo de clones genéticos — prática que, se não for bem manejada, pode facilitar a disseminação de doenças, como a Vassoura-de-Bruxa, que devastou o cacau brasileiro nos anos 1980.

Outra preocupação recai sobre a qualidade sensorial do cacau cultivado a pleno sol, já que, tradicionalmente, frutos produzidos sob sombra são associados a sabores mais complexos. No entanto, testes iniciais realizados pelo Centro de Inovação do Cacau e pela Mars indicaram que não há perda perceptível de qualidade no produto final.

“A diferença está menos na exposição solar e mais no cuidado com o pós-colheita, como fermentação e secagem”, afirma Cristiano Villela Dias, diretor científico do CIC.

Um novo polo de cacau?

Com dezenas de milhares de hectares já cultivados com grãos, fibras e frutas, o oeste da Bahia agora mira outro horizonte: o chocolate. Se os projetos em andamento forem bem-sucedidos, o Brasil pode não apenas recuperar espaço no mercado mundial, mas se tornar referência em inovação e escala na produção de cacau.

“O mundo precisa de novas fontes de produção significativa”, diz Marcelo Dorea, CEO da M3I Capital Management. “E o Brasil, com sua terra, clima e conhecimento técnico, é uma aposta natural.”

Fonte: mercadodocacau com informações reuters

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19 Comments

  1. Antonio Zugaib disse:

    Mais uma matéria com objetivos de baixarem os preços do cacau. Por ser um produto altamente volátil, as expectativas têm muita influência no comportamento dos preços nas bolsas de valores. Matérias deste porte têm interesse definido.

  2. DIONÍSIO J. LIMa disse:

    EXCELENTE MATÉRIA…!!!
    Porém só tenho uma preocupação. “A LEI DA OFERTA E DA PROCURA”. Porque este filme eu já vi …..

  3. FERNANDO DE OLIVEIRA FERREIRA disse:

    No tocando a possibilidade do surgimento da doença vassoura de bruxa acho pouco provável tendo em vista essa doença e causada por fungo, que por sua vez prolifera em ambiente de umidade em abundância. A região oeste da bahia é mais seca, isto é bem menos úmida do que a região Amazônia e o sul da Bahia onde a doença tem maltratado o cultivo do cacau.

  4. Bernadete de Paula disse:

    Projeto muito bom no sentido comercial, porém áreas tão grandes cultivadas no Cerrado, bioma que carece de muitos cuidados com a preservação, é bem preocupante.

  5. edson luis dos santos almeida disse:

    Aqui em Inhambupe, interior da Bahia, um produtor rural, afiliado a esse precursor, está plantando também o cacau. Tomara que mais esta alternativa dê certo.

  6. FRANCISCO GOMES SILVA disse:

    De grandes relevância todas informações sobre o mercado de cacau.

  7. FRANCISCO GOMES SILVA disse:

    Precisamos retomar o mercado de cacau , como passado como referência mundial.

  8. JOSEILZA SANTANA disse:

    Bom dia. Tenho uma área de 2 hectares e meio no Município de TAPEROÁ-Ba. A predominância é CACAU. Existe uma Unidade da CEPLAC aqui com boa estrutura física bem aparatada inclusive com carro. Fui em busca de informação. Na época nem pra análise de solo tinha como fazer ou entregar o material pra encaminhamento. Eu teria que levar pra CRUZ DAS ALMAS -Ba esse material. Achei não. É UM ABSURDO ISSO..

  9. ALBERTINO R BRITO disse:

    Tenho interesse em mudas

  10. Virgilio Andrade Moreira disse:

    O cacau é nativo das Américas ! Theobroma cacau.

  11. Adelino disse:

    Uma boa resposta para a outrora soberba CEPLAC!
    Aliás, segundo o documentário O Nó, membros dela, ideologicamente esquerdopatas, foram os causadores da barbárie.
    Essa porcaria que, no início, foi por demais útil para o desenvolvimento da cultura cacaueira, precisa fechar as portas, ninguém precisa mais dessa onerosa instituição.

  12. Dusantoss disse:

    Fico muito satisfeita em saber que na Bahia, está com este projeto em andamento. Pois assim os chocolates no País vão melhorar. Os grandes produtores sempre reclamam dos altos preços da matéria prima, caindo assim a qualidade do produto. Hoje os chocolates são só açúcares e gorduras hidrogenadas em alta quantidade, tirando o prazer do consumidor. E quem sabe os chocolates voltem a ter o peso e quantidade real, como era no começo.

  13. Luiz Mario disse:

    O cacaueiro não é nativo da África e sim da América.Mais precisamente da América central.

  14. Pedro Pacheco disse:

    Torço pelo sucesso de projeto. Como fica o risco da Vassoura de bruxa?

  15. Samir Cury disse:

    Substituição interessante !
    É uma espécie para clima tropical, sub tropical ?

  16. DAMACENO MOZER BRAGA disse:

    De novo a CEPLAC desmotivando!
    Que pena!!! Deveriam ajudar e colocar o conhecimentos ontem da Cultura. Inacreditável!!!

  17. Carlos disse:

    Antes da pandamia o preço da arrobas de cacau era nó máximo 65, e agora de 700 a 1000 arrobas, tenho um tio que trabalha nisto desde qdo se entende como gente e agora mas ainda, seu sorriso dobrou e qto a entidade CEPLAC, nunca passou por ela, apreendeu tudo os antigos e que muitos jovens destas vidas cacueiras não quiseram acompanhar o desenvolvimento e com isso ficou muitas fazendas abandonada, principalmente nó Sul dá Bahia, e por isso que tem muitos que trabalham na meiras, e ó exemplo de meu tio, que nasceu nisto e até hoje não abandonou oche oche, e com as ONGs aparecendo, CEPLAC vai perdendo força, está minha opinião.

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