Tocantins pode semear uma nova “cultura” do cacau no Brasil

Uma propriedade rural instalada no município de Tocantinópolis, na microrregião do Bico do Papagaio, em Tocantins, tem atraído os holofotes da cacauicultura. Entre os motivos para tal notoriedade, estão o desafio de investir em uma fruta sem tradição naquela localidade – nem no estado como um todo –, a tecnificação do empreendimento e a contribuição para as expectativas sobre a produção nacional de cacau.

O Brasil ainda é importador de amêndoas e precisa alcançar a autossuficiência para, a partir daí, buscar a posição privilegiada como exportador.

A propriedade em questão é a Fazenda Ipê Amarelo, pertencente à família Gutierrez. Na verdade, aos quatro filhos do casal de agrônomos Otávio Sampaio Gutierrez e Anita de Souza Dias Gutierrez.

Três integrantes desse quarteto também têm formação em agronomia, o quarto é engenheiro químico. A base agronômica certamente contribuiu para que o projeto se tornasse uma vitrine tecnológica.

No início de setembro, a Fazenda Ipê Amarelo integrou a programação da 1ª Rota da Fruticultura, iniciativa do governo de Tocantins, por meio da Secretaria de Estado da Agricultura e Pecuária (Seagro) e da Agência de Defesa Agropecuária (Adapec).

A propriedade recebeu diversos profissionais ligados à produção de cacau, interessados em conhecer o desenvolvimento do cacau na região.

Em uma área de 92 hectares, são cultivados 115 mil pés de cacau. “Até o final deste ano, plantaremos mais 18 hectares e, em 2025, teremos outros 30 hectares”, disse o gerente-geral da fazenda, Adelson Reis.

Segundo o gestor, 80% das plantas já estão produzindo razoavelmente dentro do planejado, com rendimento médio de 1.150 quilos de amêndoa por hectare. Também há o cultivo de pimenta-do-reino, em 22 hectares.

O projeto agrícola começou em 2015, do zero, e houve três anos de preparação, de adequação da fazenda para o cultivo. As plantas mais velhas estão com seis anos, e aí está um ponto interessante que ajuda a atrair outros investidores para a atividade e a chamar a atenção da indústria. “O cacau é uma planta que tem futuro, dura uns 50 anos”, afirmou Reis.

As três principais processadoras mundiais da commodity – Cargill, Olam e Barry Callebaut – já adquirem as amêndoas na região, segundo o gerente da Ipê Amarelo.

“Fornecemos principalmente para a Barry Callebaut”, disse ele. “E conseguimos uma diferenciação de preço pelo padrão do produto e pela quantidade que oferecemos. Tenho um carregamento saindo a R$ 67 o quilo da amêndoa, enquanto o preço médio está em R$ 40.”

Para a presidente-executiva da Associação Nacional das Indústrias Processadoras de Cacau (AIPC), Anna Paula Losi, a possibilidade de expansão do cultivo da fruta em novas fronteiras – como Tocantins, norte de Minas Gerais, oeste da Bahia e até mesmo São Paulo – é uma boa notícia.

“Por conta dessas novas áreas e dos investimentos nas áreas tradicionais, podemos mudar, nos próximos anos, o cenário de dependência da importação”, afirmou a dirigente.

Anna Paula comenta ainda a contribuição dessas regiões não tradicionais para a evolução tecnológica do setor. “Infelizmente, a produção do cacau ainda tem uma característica mais extrativista, depende muito de mão de obra, tem poucas máquinas, há muito a ser feito”, disse. “E, de maneira geral, nessas novas áreas entram produtores mais acostumados com a alta tecnologia.”

Esse diferencial técnico é fortalecido pelo conhecimento já existente, pelas tecnologias já difundidas nas áreas tradicionais. E a soma desses diferenciais aumenta o potencial de sustentabilidade da atividade.

Como explica Anna Paula, onde há tradição do cultivo do cacau, também está presente a visão da sustentabilidade, de preservação, e evita-se o desmatamento. As novas áreas surgem ainda como opção de recuperação de áreas. Tudo isso é um chamariz aos mercados mais exigentes, como Europa e Estados Unidos.

“O Brasil é a bola da vez, só precisamos tomar as medidas certas e aproveitar as oportunidades”, afirmou a presidente-executiva da AIPC.

A entidade, que está completando 20 anos, é formada por Barry Callebaut, Cargill, Olam e IBC, que juntas são responsáveis por aproximadamente 95% da compra e da moagem de cacau no Brasil.

Conforme dados da AIPC, o setor responde por mais de 4.000 empregos diretos e indiretos e integra uma cadeia de mais de 120 mil pessoas, incluindo produtores rurais e indústrias de chocolate. Estima-se que o setor, como um todo, represente R$ 23 bilhões anuais de valor gerado ao país.

Expectativa de recuperação

Os players do mercado brasileiro de cacau esperam que o segundo semestre traga resultados melhores do que os registrados na primeira metade do ano. Como consequência de problemas climáticos e desafios sanitários, os quatro estados que lideram a produção da fruta no país apresentaram queda de desempenho.

As estatísticas da AIPC mostram que, de janeiro a junho de 2024, a Bahia produziu 34,5 mil toneladas de amêndoas, o que representa 59% do volume total nacional, mas também significa retração de 32,3% em relação às 51 mil toneladas do primeiro semestre de 2023.

Proporcionalmente, a redução foi ainda maior no Pará. A produção de 21 mil toneladas de amêndoas nos primeiros seis meses deste ano (36% do volume total do país) foi 46% menor do que a registrada em igual período do ano passado.

Com a redução na oferta de amêndoas, seja pela menor produção, seja pela queda nas importações (no primeiro semestre de 2024, o Brasil importou de 22,5 mil toneladas, frente às 43 mil toneladas importadas entre janeiro e junho de 2023), a moagem também caiu (9,5%). Na mesma comparação, a industrialização foi reduzida de 126,4 mil toneladas para 114,3 mil.

Para a safra 2024/25, a expectativa é de que possa ocorrer uma virada, devido à combinação entre o recuo na demanda e a recuperação da produção. Tudo vai depender ainda do comportamento do clima durante todo o segundo semestre, conforme análise da consultoria StoneX, divulgada pela AIPC.

Fonte: agfeed

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