A produção do estado lidera a mistura de variedades no país
O que o melhor chocolate artesanal produzido no Brasil em 2021 nos conta? A resposta é simples: que o Brasil produz cacau de qualidade. E não foi só a premiação nacional que demonstrou isso. Três brasileiros estiveram entre os 50 melhores do mundo no Cocoa of Excellence Awards (Salão do Chocolate de Paris), tendo recebido uma condecoração na categoria ouro e duas pratas dentre os selecionados da América do Sul.
A produção do estado do Pará domina os blends (mistura de variedades). É do assentamento Tuerê, em Novo Repartimento, a amêndoa de cacau utilizada na receita da chocolateira vencedora do prêmio CNA Brasil Artesanal.
“Esse chocolate foi produzido a partir da amêndoa de cacau de um assentamento da Amazônia. É resultado de muito trabalho e muita pesquisa. Estou muito feliz”, afirma a chef Priscila França Rosendo.
O produtor do cacau que se distingue ao paladar é Francisco Cruz. Apesar de não ter participado diretamente da premiação, o jovem agricultor se declara honrado da conquista por ter processado uma amêndoa de tanta qualidade. Cruz ainda esteve em 2019 no salão de Paris.
Na edição deste ano da maior premiação de chocolate do mundo, o Pará também marcou presença. O produtor João Evangelista Lima recebeu o prêmio na categoria prata e teve o trabalho de 18 anos com cacau internacionalmente reconhecido. Já no país, o cacaueiro foi homenageado pelo feito no III Concurso Nacional de Qualidade de Cacau Especial do Brasil.
“Me sinto privilegiado! Como pequeno produtor, eu comecei do começo, a plantar e a colher. Mas eu não consegui isso sozinho, temos toda a equipe, técnicos. Agora eu tenho um objetivo na minha vida… eu gosto tanto de preservar a natureza, de plantar árvore. Hoje, poucos produtores podem dizer que mantém espécies como o mogno. Na minha pequena propriedade tenho de 25 a 30 variedades preservadas ao meu redor”, disse orgulhoso no evento.
Os cacaueiros de João Evangelista preservam o meio ambiente enquanto produzem. A árvore de cacau cresce em consórcio com espécies nativas, pés de cupuaçu e banana num sistema de agroflorestal, no qual o componente florestal sequestra e fixa o carbono no solo. O sistema, inclusive, é uma das tecnologias implementadas pelo Plano ABC+ e deve ser implementado em 100 mil hectares até 2030, conforme cronograma das ações.
“A cacauicultura é totalmente aderente à preservação do ambiente e à fixação de carbono. A gente quer atuar para a captação de recursos e para desenvolver projetos para a remuneração por conservação ambiental e créditos de carbono. Já na questão da qualidade, o cacau brasileiro é fruto de trabalho descente e fruto de produção sustentável, o que já se exige no mundo de hoje, principalmente após a COP26”, acrescenta o Diretor da Comissão Executiva do Plano da Lavoura Cacaueira (Ceplac), Waldeck Pinto.
Cacau fino de qualidade
Para o diretor da Ceplac, o futuro do Brasil está na produção de cacau de qualidade seja para o consumo interno quanto para exportação. Apesar de não ser mais o maior exportador de cacau do mundo (atualmente o país reveza entre a sexta e a sétima posição), os produtores em parceria com órgãos técnicos empregam novas tecnologias e buscam o melhoramento genético das espécies.
Isso alterou o cenário de recuperação da crise na lavoura cacaueira e demostra um investimento na qualidade do produto. Por isso, além de ter estabelecido como meta a autossuficiência em 2025 com uma previsão de produção de 270 mil toneladas, a Ceplac buscar trabalhar com o aumento da qualidade da amêndoa do cacau, de 3% para 5%.
O que, na prática, somente pode ser aferido com a participação dos produtores em concursos e premiações. Pelas análises de especialistas, o cacau fino tem potencial aromático e zero conteúdo de off-flavor, retirando defeitos ou notas estranhas e não agradáveis que acabam trazendo ao chocolate traços metálicos, de borracha ou até fumaça – que a depender do nível é bem desagradável. Essas notas estranhas podem ocorrer em erros de processamento dos grãos ou de armazenamento.
Em sua terceira edição, o Concurso Nacional de Qualidade do Cacau Especial do Brasil mostra que, neste momento, o cenário é de investir na qualidade do produto para diferenciação e agregação de valor ao cacau, estimulando e promovendo a excelência da produção de cacau no Brasil, em todas as suas etapas.
“Estamos vendo uma transformação gradual na cadeia nos últimos anos. Uma cadeia muito mais unidade, muito mais engajada para fortalecer esses elos. Esse é um trabalho conjunto: produtores, processadores, chocolateiras, governo, associações para colocarmos o Brasil de uma vez por todas no rol dos melhores cacaus de chocolates do mundo”, defendeu o diretor Científico do Centro de Inovação do Cacau (CIC), Cristiano Vilela.
“Onde é Medicilândia?”
Os diferentes aromas e sabores formam a grande complexidade e diversidade do cacau brasileiro. O último Censo Agropecuário do IBGE (2017) mostra que há 620 mil hectares de cacau plantados no Brasil, cultivados por 93 mil produtores.
A cadeia de suprimentos do cacau gera cerca de 300 mil empregos diretos e indiretos, sendo responsável por R$ 18 bilhões em valor bruto da produção, segundo a Fiesp. Depois da Bahia, que concentra 70% da produção, o Pará desponta no mercado com 25%. Rondônia e Espírito Santo também são importantes produtores.
O destaque na produção paraense reflete a qualidade das amêndoas. Medicilândia, Brasil Novo, Novo Repartimento indicam a procedência das melhores do Brasil na categoria blend da edição de 2021 do Concurso Nacional de Qualidade de Cacau Especial do Brasil.
Das 94 amostras de todo o país, o terceiro lugar ficou empatado entre José Renato Preuss, produtor de Brasil Novo, e João Rios de Souza, de Novo Repartimento. De Medicilândia, estão os dois primeiros lugares: Robson Brogni e Hélia Félix de Moura.
Ela, que tantas vezes ouviu a pergunta, após a premiação responde orgulhosa: “Onde é Medicilândia? É lá no Pará, onde se produz amêndoa de cacau de qualidade! Gratidão e felicidade resumem o trabalho reconhecido, de ser mulher, produtora e participar de uma cooperativa, muitas vezes desacreditada”. Fonte: Agrolink