Oeste aposta no cacau e tem produtividade 177% maior que média de melhor região do país

Especialistas acreditam em potencial para se somar com Sul da Bahia e outras localidades do Brasil

Jorge Amado foi taxativo: “A melhor terra do mundo para o plantio do cacau”, disse sobre a Bahia. Quando se pensa em cacau por aqui, a mente vai direto ao Sul, mas uma outra região está apostando nessa produção e já apresenta resultados bastante positivos. O Oeste baiano agora abre espaço para o cacau, atingindo uma produtividade 177% acima dos locais com melhores médias do país. Especialistas acreditam que a produção na região pode somar forças para suprir demanda interna e ainda devolver ao Brasil o posto de grande exportador do fruto.

A região Oeste é muito marcada pelo agronegócio. Destaca-se pelo plantio de soja, milho e algodão. Possui projetos em diversas áreas ligadas ao campo, como criação de gado de corte, abatedouros de aves, uma fruticultura estabelecida e em crescimento, dentre outras atividades. Mas, há sete anos, iniciou um projeto de testes com o cacau. Atualmente, seis fazendas fazem experimentos com a planta, totalizando uma área de plantio de 180 hectares.

As áreas plantadas no Oeste ainda estão em fase experimental, mas os resultados impressionam. Em Riachão das Neves, por exemplo, a Fazenda Solaris vem registrando produtividade de 2.550 kg/hectare. A nível de comparação, no Pará, onde atualmente se tem as melhores marcas do Brasil, dados do IBGE de 2019 apontam uma média de 918 kg/hectare.

Ou seja, na plantação experimental da cidade no interior baiano vem sendo alcançada uma produtividade 177% maior do que a média paraense. Já a média de todo o Brasil é de 446 kg/hectare, e a da Bahia de 274 kg/hectare, respectivamente 571% e 930% menores que a média de Riachão das Neves.

“Os números da produtividade da cultura na região vêm nos deixando entusiasmados. Em 2021, estimamos que à área já plantada com cacau no Oeste serão acrescentados pelo menos mais 840 hectares”, comenta o secretário da Agricultura, Pecuária, Irrigação, Pesca e Aquicultura da Bahia, João Carlos Oliveira. “Estamos presenciando o início de um novo ciclo para o cacau na Bahia, com estímulo da produção nas regiões tradicionais e acréscimo da região Oeste, que chega com muita força”, diz

Para Moisés Schmidt, do Grupo Schmidt Agrícola e vice-presidente da Associação de Agricultores e Irrigantes da Bahia (Aiba), o que explica os bons resultados é, principalmente, o uso da tecnologia. “Nós estamos migrando toda a tecnologia que temos de grãos e algodão para a cultura do cacau”, diz. Além disso, outros fatores apontados por ele são a intensidade do sol e o tipo de solo.

“A região se mostra promissora para várias culturas por conta da intensidade do sol na região. Estamos desmistificando a ideia de que o cacau tem que ficar numa região sombreada. Temos cacau plantado em pleno sol com excelentes resultados. Outro benefício é a facilidade de mecanização em larga escala devido ao relevo e solo. Estamos aprendendo a trabalhar cacau com mecanização e como fruticultura e, não, como extrativista”, acrescenta.

Schmidt afirma, no entanto, que o cacau não vai sair do Sul da Bahia e acredita que a região Oeste tem potencial para somar forças com outras regiões da Bahia e do Brasil para elevar ainda mais a posição do país, que hoje aparece em sétimo lugar no ranking de produtores mundiais, no cenário internacional.

“O Brasil precisa agregar cacau para abastecer o mercado interno e poder voltar para o mercado de exportação. Hoje, estamos precisando importar. Nós entendemos que o Oeste da Bahia vem para possibilitar isso. Somando forças com o Sul da Bahia e o Pará, podemos suprir a nossa demanda interna, fazendo com que o Brasil volte a ser, além de grande produtor, um grande exportador de cacau”, finaliza.

Vale ressaltar que, além de sucos, polpas e doces, do cacau se extrai as amêndoas que, processadas, transformam-se em deliciosos chocolates. Segundo a Associação Nacional das Indústrias Processadoras de Cacau (AIPC), o setor gera no Brasil cerca de 200 mil empregos diretos e indiretos, aproximadamente 95 mil só na Bahia.

Quem acredita em bruxa?

A vassoura de bruxa é uma praga causada pelo fungo Moniliophtora perniciosa que colocou fim aos tempos áureos da produção cacaueira na Bahia. Ela deixa os ramos da planta secos, com aparência de uma palha ou vassoura e, assim, dizimou pés de cacau em 1989 e fez a produção cair de 400 mil toneladas para 92 mil toneladas em 1990, levando os produtores da região à falência.

Para se ter uma ideia, no ápice produtivo, em 1986, a Bahia chegou o equivalente 90% da produção brasileira à época. Desde o grande desastre, a região nunca se recuperou totalmente e vem lutando para combater a vassoura de bruxa, que nunca foi completamente extinta.

O produtor Antelmo Farias, de 64 anos, viu sua família ser prejudicada pela praga. Há 28 anos, ele fez as malas e partiu para a região Oeste. Hoje, é proprietário da Fazenda Solaris, uma das que vem apresentando resultados promissores de produtividade do fruto. A intenção inicial da mudança, no entanto, não era dar continuidade ao cultivo daquele que foi motivo de tanta tristeza.

“Eu não vim para cá com o intuito de produzir cacau, eu nem queria mais comer chocolate de tanta raiva que eu tinha do cacau. Meu pai morreu com depressão depois das dívidas provocadas pela devastação que a vassoura de bruxa causou. Mas, em 2015, eu visitei uma área de cacau e enxerguei um potencial ali, se fosse implementado um investimento”, explica Farias.

Ele conta que a área apresentava diversos problemas e seria utilizada por um vizinho para plantio de maracujá, quando ele resolveu investir no local. “Aceitei o desafio da quebra de paradigma. Muita gente me chamou de louco, disse que era para eu voltar ao Sul, que não ia dar certo aquilo ali. Mas eu acredito que o Oeste vai surpreender o mundo com a produção de cacau”, afirma.

“É uma região de clima extremamente favorável. Já demonstrou isso com a soja, com o milho, com o algodão e poderia mostrar também com o cacau. A área que eu adquiri se recuperou e nós tivemos uma alta produtividade. Hoje estamos com uma produção média de 200 arrobas de cacau com perspectiva de aumentar isso porque temos novas áreas plantadas”, ressalta.

Farias ainda afirma que a região tem uma grande vantagem contra a vassoura de bruxa, devido ao clima local, e acredita que, a partir de agora, o cacau só deve ser motivo de alegria. “Num período de chuva a gente faz o manejo, poda, etc. E aí vamos produzir o cacau no período seco, já que a vassoura não resiste num ambiente de umidade abaixo de 30%. O Sul da Bahia, por exemplo, que sofreu muito com a doença, é uma região com umidade o ano inteiro, entre 70 e 80%”, conclui.

*Com orientação da chefe de reportagem Perla Ribeiro

fonte: Correio

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