UMA CHAMA DE ESPERANÇA

Dilson Araújo (17set2020)

Em recente conferência com as Câmaras Setoriais do agronegócio brasileiro, inclusive a do cacau, a Ministra da Agricultura, Tereza Cristina, sinalizou na direção daquilo que pode ser o início da resolução de dois dos principais pro- blemas crônicos da lavoura cacaueira do sul da Bahia: O endividamento, consequência direta do terrorismo biológico; e o manejo do sistema cacau-cabruca, hoje impraticável e bem distante de um modelo sustentável.

Ao falar sobre o endividamento, a Ministra mostrou-se disposta a enfrentar o problema a partir de uma solução “específica pro cacau da Bahia”, abordagem diferente daquela até então adotada por algumas lideranças dos cacauicultores grapiúnas que, carentes de força política, profissionalismo e ousadia, não foram capazes de construir e emplacar suas próprias propostas e soluções, limitando-se a pegar carona em renegociações genéricas ou direcionadas a outras culturas e regiões que, por não considerarem as especificidades do caso do cacau, nunca atendiam à maioria absoluta dos inadimplentes, principalmente em razão da ausência de ações conjuntas para o reestabelecimento da produção a níveis sustentáveis.

Com relação à cabruca, a Ministra se propôs a estudar uma saída, inclusive com a possibilidade de uma eventual federalização da regulamentação do seu manejo, medida que, a partir de estratégias, técnicas e práticas já conhecidas, agregaria receitas através do excedente de madeira, da produção de frutas, da extração de óleos e essências, etc., além de aumentar a produtividade das plantações de cacau, o que traria viabilidade ambiental, econômica e social a este importante sistema agroflorestal, cuja área representa metade dos cacauais no sul da Bahia, mas que hoje se encontra inviabilizada em razão das severas limitações impostas pela legislação estadual, o que vem massacrando os produtores (que já mantêm suas reservas legais), e gerando sérios efeitos deletérios não só para a economia regional, mas também para a preservação do meio ambiente, pois em mais de 250 anos de cultivo, o sistema cacau-cabruca foi a mais eficiente barreira de proteção do bioma Mata Atlântica no sul da Bahia e a sua inviabilidade representa um fomento ao comércio ilegal de madeira e à consequente “pecuarização” dessas áreas, com irrepará- veis prejuízos à fauna, à flora e aos recursos hídricos. Este é um filme que já vimos no início da crise da vassoura-de- bruxa e que não vale a pena ver de novo.

Muito mais do que se esperava ouvir, a fala da Ministra acendeu uma chama de esperança, pois, ao abrir a possibilidade de uma solução específica para o caso, implicitamente se dispôs a considerar o contexto da problemática, dando aos produtores a preciosa oportunidade de demonstrarem não só a sua caótica situação e demandas emergenciais, mas, principalmente, que não deram causa ao endividamento, uma vez que este teve origem em uma ação criminosa e foi potencializado com o fracasso do Programa de Recuperação, que impôs aos cacauicultores diversas recomendações técnicas que não apresentaram resultados positivos, ocasionando principalmente a perda de capacidade produtiva dos cacauais, fatos notórios, que decorreram de ações equivocadas, de inteira responsabilidade do Estado e que estão atestados pela CEPLAC em estudos e notas técnicas, além de relatados em um Inquérito Policial Federal e uma Sindicância Interna do próprio Ministério da Agricultura. Assim, são estes alguns dos necessários e justos contrapesos para melhor equilibrar os pratos da balança de uma possível renegociação, o que habilita o produtor a ousar ir além dos descontos e parcelamentos e pleitear, não só a imprescindível abertura de crédito em condições especiais, mas também, e necessariamente, a suspensão das ações judiciais e inscrições na dívida ativa; exclusão de tudo que já se encontra prescrito, bem como o levantamento dos gravames e penhoras das propriedades.

Saliente-se, ainda, que a interdependência entre os dois problemas naturalmente impõe o óbvio, pois seria contraproducente resolver o endividamento sem que paralelamente haja uma solução capaz de recuperar o sistema produtivo, principalmente o cacau-cabruca, para que devolva aos produtores a aptidão ao crédito e capacidade produtiva que gere retorno econômico satisfatório para honrar os compromissos que venham a assumir para recuperação das suas propriedades e repactuação de dívidas. Tais fatores, cuja combinação de resultados é fundamental para o sucesso deste “pacote emergencial”, podem ainda iniciar um círculo virtuoso e consolidar uma base de sustentação para um amplo projeto de desenvolvimento socioeconômico e ambiental baseado nas potencialidades e vocações locais, com boas perspectivas de geração de emprego e renda, o que revolucionaria o sul da Bahia.

É uma oportunidade ímpar, provavelmente a melhor em décadas e que dificilmente se repetirá. Porém, tudo depen- de de como o assunto será conduzido, pois requer altos níveis de profissionalismo, muito comprometimento e transparência, para que não se corra o risco de uma reprise do maligno e malfadado Programa de Recuperação. Contudo, reconhecendo que Milton Andrade, presidente da Câmara Setorial Nacional do Cacau e atual presidente do Sindicato Rural de Ilhéus tem o mérito de ter provocado as manifestações da Ministra, é dele a missão de conduzir o processo e, através da união das Representações do cacau, formar equipes técnicas, obrigatoriamente conectadas com os  mais sólidos exemplos de sucesso já em funcionamento na região, para assim produzir os subsídios específicos e necessários não só ao Ministério da Agricultura, mas também aos Ministérios da Economia e do Meio Ambiente, já que provavelmente estarão envolvidos na avaliação do caso.

Pés no chão e mãos à obra!

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